Iniciava o século XVIII, em uma fazenda no interior
da Bahia nascia uma menina, filha de escrava com feitor branco.
Tinha pele cor de cuia e recebeu o nome de Ana.
Sua mãe morreu no parto, por isto foi criada pela
avó, a Negra Zulmira, que era tida como rezadeira, sendo sempre chamada para
encomendar a alma dos negros que morriam pelos maus tratos, por doença, ou seja
lá qual fosse a causa.
Ana cresceu acompanhando as rezas de sua avó. Ficava
encolhida num canto da senzala, só espiando. Ela conseguia ver e ouvir as
almas, mas não tinha medo.
Gostava de passear pelo cemitério dos brancos e
conversar com as almas que por lá perambulavam.
Um dia em que se demorou mais neste passeio, a Negra
Zulmira, preocupada, saiu a procurá-la. Quando adentrou o cemitério e a viu
conversando com as almas, decidiu que era hora de ensinar-lhe tudo a respeito
deste seu ‘ofício’.
Os negros não tinham cemitério. Seus corpos eram
jogados no rio, para os peixes comerem, ou deixados no mato, às feras. Os espíritos
destes negros, muitos revoltados, ficavam vagando, querendo vingança, até serem
chamados pelas preces da escrava rezadeira.
Dentro da senzala, bem disfarçado para que os
feitores não percebessem, havia um local sagrado para os escravos. Era para
este local que eram ‘chamados’ os espíritos destes negros. E ali eram
auxiliados.
A Negra Zulmira era a encarregada deste auxílio,
sempre acompanhada de Ana, e dos Orixás que ali eram cultuados, também.
Ana ficava encantada com a luz que os Orixás
irradiavam.
Um, em particular, chamava sua atenção.
Era uma mulher, usava um longo vestido vermelho, uma
espécie de véu, também longo, sobre a cabeça, preso por uma corda feita de
cipós. Na mão, ela tinha uma espada de fogo.
Ana gostava de ficar observando quando este espírito
de luz rodopiava, sem pisar o chão, formando redemoinhos de fogo com a espada e
recolhendo as almas, levando-as ela não sabia ainda para onde.
Por vezes, em suas brincadeiras, tentava imitá-la,
andando em círculos, até ficar tonta e quase ir ao chão.
Ana então perguntou a avó quem era aquele espírito
de mulher, toda de vermelho, que ela via sempre quando estavam rezando as
almas.
E a Negra Zulmira respondeu: é Iansã, a Orixá dos
Ventos e explicou a ela tudo que podia compreender, sobre este e os demais
Orixás.
Terminada a explicação, Ana declarou, determinada:
- Quero ser como ela!
Em noites de tempestade, trancada na senzala, Ana
ficava aflita, não conseguia dormir. Seu desejo era sair e se banhar naquela
chuva, sentir o vento, assustar-se (só um pouco) com o som dos raios e dos
trovões. Enfim, sentir-se livre. Acabava adormecendo e seu espírito, liberto,
podia atender seu desejo.
Ana já era mulher feita quando sua avó morreu. A
partir deste dia, assumiu seu lugar, passando a ser chamada de Negra Ana
Rezadeira.
Viveu para esta missão, sempre auxiliada pelo
espírito da Negra Zulmira, sua avó e, quando morreu, foi acolhida pela avó e,
claro, por Iansã.
Levada para Aruanda, depois de anos de treinamento e
estudo, conforme seu desejo, passou a ser também uma falangeira de Iansã.
Hoje, trabalha em uma Seara de Luz, usando como ‘cavalo’
alguém que conheceu naquele tempo, naquela fazenda e por quem ela também rezou
a alma.
Mas esta é uma outra história.
Extasiada com a história da menina Ana. Eparrey Iansã!
ResponderExcluirImagina eu rsrsrs
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