AVISO IMPORTANTE:

* Nossa casa fica em Porto Alegre (RS), Av. 21 de Abril, 1385, Vila Elizabeth, Bairro Sarandi. * Dia 4/3/23 não haverá Gira (trabalho externo) * Dia 11/3/23 voltamos ao horário normal das Giras de Pretos Velhos, aos sábados, 15h

domingo, 18 de novembro de 2018

Rúbia, la vieja gitana

Por Cândida Camini

Era Gira de Ciganos no Terreiro.
Mal a música inicia, percebo uma energia me envolver e que aos poucos vai tomando conta de meu campo energético.
Lhe oferecem uma bengala, que aceita e se dirige muito devagar ao Congá, reverenciando principalmente Santa Sarah e o Povo Cigano que ali está representado.
Poucas palavras, avisa que deve voltar no final da Gira, se o 'aparelho' (no caso, eu), permitir a manifestação, que por ser a primeira vez está muito difícil.
No final da Gira, como já era previsto, devido ao meu trabalho como Cambona Chefe, não foi possível o seu retorno.
Porém, na Gira seguinte, dois dias depois, enquanto dançava, Carmem me mostra algumas imagens de una vieja gitana.
Revela-me seu nome, Rúbia e nada mais.
Dois dias depois, novamente, em uma prática de meditação, me foi passado o que relato a seguir:

Acampamento cigano.
Uma tenda não muito grande, colorida, como não podia deixar de ser.
Do lado de fora, uma velha cigana sentada em uma cadeira de balanço, feita de galhos e troncos finos de árvore, revestida com almofadas e lenços coloridos.
Rúbia é o nome dela.
Seu espírito é milenar, sua aparência é de mais de 100 anos de idade.
Emana dela uma energia forte, uma ancestralidade sem limites.
No chão, aos seus pés, três cestos. 
No primeiro, fitas coloridas.
No segundo, vários tipos de ervas.
No último, galhos de árvore, finos e pequenos.
Ela escolhe algumas fitas de cores diversas, uma ou outra erva e trama com um pequeno galho.
Seu olhar é ao mesmo tempo doce e determinado.
Seus gestos, apesar de suaves, são precisos.
Aquele tramar de elementos demora um certo tempo.


Por vezes, olha para as chamas da fogueira, desmancha e inicia uma nova trama.
Por outras, observa a água que descansa em um tacho de cobre ao seu lado e só termina o seu 'tramado', quando percebe que está em harmonia com o que vê no fogo e na água.
Fecha os olhos, agradece à Santa Sarah, deposita a trama no chão e reinicia o processo.
Desta vez são outras cores de fitas, outras ervas, outros galhos, variando conforme o que as chamas da fogueira e a água no tacho de cobre lhe dizem.

Pergunto o que ela está fazendo, qual o significado deste trabalho.
É Carmem quem me responde, me mostrando e explicando qual o papel da vieja gitana neste Clã.

Devido a sua ancestralidade, sabedoria e discernimento, ela é a responsável por programar  a próxima reencarnação de um Cigano ou Cigana do Clã, que necessite voltar ao plano terreno.

Quando chega o momento do retorno à face da Terra, ela convoca aqueles que precisam reencarnar e os orienta sobre os primeiros passos. Precisam escolher a lenha e coletar a água que serão utilizadas durante o ritual. O tipo de lenha e água auxiliará a definir seus destinos. Madeiras mais rijas e duradouras, mais tenras e frágeis. Água do rio na sua nascente, ou quando deságua no mar, água da cachoeira, das corredeiras. Detalhes que farão toda a diferença.

É numa noite de lua crescente, que a fogueira de cada um é montada e acesa e a água escolhida, derramada no tacho de cobre. 

Junto com Rúbia, observam nas chamas da fogueira, os karmas que precisam ser queimados e na água do rio, que está na bacia de cobre, o dharma, ou seja, aqueles bens morais e espirituais que amealhou em vidas passadas e que o auxiliarão a cumprir sua missão. 


Me é dito também que um Cigano nunca reencarna só. O plano reencarnatório é elaborado para um grupo familiar. Por isso Rúbia estava tecendo mais de uma trama. Na verdade, as cores das fitas e as ervas, são as energias que irão acompanhar e auxiliar o viver de cada um. O galho representa o corpo físico que irão habitar durante esta encarnação.

Terminado o ritual, os(as) ciganos(as) transmutam sua roupagem para aquela que irão utilizar na próxima vida e voltam à convivência do bando, levando consigo, cada um, a sua trama energética, de fitas, ervas e galhos, até que chegue o momento de voltar ao plano terreno, onde viverão uma vida cigana, mais uma vez. E é neste momento que o chefe do Clã, o Cigano Igor, assume a responsabilidade por eles. 

Mas esta é uma outra história, que ele mesmo irá nos contar quando de seu retorno, já que neste momento encontra-se nesta missão.

La Vieja Gitana Rúbia exerce esta função neste Clã a muito tempo. E nela permanecerá até o momento em que sua ascenção a outros planos se fizer necessária. Nesta hora, sua substituição será determinada pelo mais alto e sobre esta escolha, não há informações.

Gratidão pelo ensinamento!

Optchá, Rúbia!

Optchá todo Povo Cigano !


quarta-feira, 4 de abril de 2018

Ana, uma escrava na Linha de Caboclos

por Cândida Camini


Iniciava o século XVIII, em uma fazenda no interior da Bahia nascia uma menina, filha de escrava com feitor branco.
Tinha pele cor de cuia e recebeu o nome de Ana.
Sua mãe morreu no parto, por isto foi criada pela avó, a Negra Zulmira, que era tida como rezadeira, sendo sempre chamada para encomendar a alma dos negros que morriam pelos maus tratos, por doença, ou seja lá qual fosse a causa.
Ana cresceu acompanhando as rezas de sua avó. Ficava encolhida num canto da senzala, só espiando. Ela conseguia ver e ouvir as almas, mas não tinha medo.
Gostava de passear pelo cemitério dos brancos e conversar com as almas que por lá perambulavam.
Um dia em que se demorou mais neste passeio, a Negra Zulmira, preocupada, saiu a procurá-la. Quando adentrou o cemitério e a viu conversando com as almas, decidiu que era hora de ensinar-lhe tudo a respeito deste seu ‘ofício’.
Os negros não tinham cemitério. Seus corpos eram jogados no rio, para os peixes comerem, ou deixados no mato, às feras. Os espíritos destes negros, muitos revoltados, ficavam vagando, querendo vingança, até serem chamados pelas preces da escrava rezadeira.
Dentro da senzala, bem disfarçado para que os feitores não percebessem, havia um local sagrado para os escravos. Era para este local que eram ‘chamados’ os espíritos destes negros. E ali eram auxiliados.
A Negra Zulmira era a encarregada deste auxílio, sempre acompanhada de Ana, e dos Orixás que ali eram cultuados, também.
Ana ficava encantada com a luz que os Orixás irradiavam.
Um, em particular, chamava sua atenção.
Era uma mulher, usava um longo vestido vermelho, uma espécie de véu, também longo, sobre a cabeça, preso por uma corda feita de cipós. Na mão, ela tinha uma espada de fogo.
Ana gostava de ficar observando quando este espírito de luz rodopiava, sem pisar o chão, formando redemoinhos de fogo com a espada e recolhendo as almas, levando-as ela não sabia ainda para onde.
Por vezes, em suas brincadeiras, tentava imitá-la, andando em círculos, até ficar tonta e quase ir ao chão.
Ana então perguntou a avó quem era aquele espírito de mulher, toda de vermelho, que ela via sempre quando estavam rezando as almas.
E a Negra Zulmira respondeu: é Iansã, a Orixá dos Ventos e explicou a ela tudo que podia compreender, sobre este e os demais Orixás.
Terminada a explicação, Ana declarou, determinada:
- Quero ser como ela!
Em noites de tempestade, trancada na senzala, Ana ficava aflita, não conseguia dormir. Seu desejo era sair e se banhar naquela chuva, sentir o vento, assustar-se (só um pouco) com o som dos raios e dos trovões. Enfim, sentir-se livre. Acabava adormecendo e seu espírito, liberto, podia atender seu desejo.
Ana já era mulher feita quando sua avó morreu. A partir deste dia, assumiu seu lugar, passando a ser chamada de Negra Ana Rezadeira.
Viveu para esta missão, sempre auxiliada pelo espírito da Negra Zulmira, sua avó e, quando morreu, foi acolhida pela avó e, claro, por Iansã.
Levada para Aruanda, depois de anos de treinamento e estudo, conforme seu desejo, passou a ser também uma falangeira de Iansã.
Hoje, trabalha em uma Seara de Luz, usando como ‘cavalo’ alguém que conheceu naquele tempo, naquela fazenda e por quem ela também rezou a alma.
Mas esta é uma outra história.

segunda-feira, 2 de abril de 2018

Quando o Coração Fala (11)


O Kelvin é um menino adorável, filho de Oxum. Entrou para a corrente mediúnica de nosso Terreiro no início de 2017 e, mesmo com sua pouca idade, tem uma entrega e um comprometimento lindo de se ver.
Ano passado solicitou permissão para aprender a tocar o tambor. Permissão concedida, vem se dedicando com todo seu amor pela Umbanda e nos encantando com sua vibração.
Como todo jovem, tem suas inseguranças, se sente discriminado de alguma forma, enfim...
Na Umbanda, foi acolhido e tratado como igual.
Na última Gira de Caboclos, no encerramento, era visível a sua emoção e de alguma forma sabíamos que algo de muito especial estava acontecendo com ele. Nos emocionamos juntos.
Hoje ele nos brinda com este relato. Obrigada, querido, por compartilhar!

FINALMENTE LIVRE 
Por: Kelvin Lorran

Eu não aguentava mais ficar o tempo todo preso naquelas correntes, mas também não fazia nada para me libertar. 
A sensação de estar preso nas correntes do próprio medo e da tristeza me fazia sentir menos do que eu era, menos do que eu sou! 
O ruim de tudo isso é que eu me fazia de vítima e dizia que as pessoas me machucavam! 
Sendo que era eu mesmo que fazia isso com os meus sentimentos! 
Hoje eu tenho a noção de que eu estou com as chaves dessas correntes. Mas não foi fácil consegui-las e não está sendo fácil mantê-las!
 Nossos sentimentos nunca são os mesmos a todo tempo e isso é bom! 
A cada dia nós nos estressamos, amamos, sentimos e vivemos e isso é a melhor coisa que temos para o nosso aprendizado. 
Às vezes precisamos de um tempo para pensar em nós mesmos e nos organizarmos internamente. 
Os nossos sentimentos sempre vão mudar de acordo com o tempo e devemos estar preparados para aceitar. 
"Aceitar não quer dizer não fazer nada mas sim entender e se adaptar com a situação." 
Mas as correntes podem voltar! Se nós nos deixarmos levar pelas emoções e ficarmos pensando no que os outros pensam, as correntes voltam e nos fazem escravos de nossas próprias emoções. 
Na segunda feira quando eu chorei tocando o tambor era como se as correntes tivessem sido quebradas e naquela hora quando meus olhos estavam fechados eu acordei. 
Foi simplesmente incrível e queria compartilhar isso com vocês