AVISO IMPORTANTE:

* Nossa casa fica em Porto Alegre (RS), Av. 21 de Abril, 1385, Vila Elizabeth, Bairro Sarandi. * Dia 4/3/23 não haverá Gira (trabalho externo) * Dia 11/3/23 voltamos ao horário normal das Giras de Pretos Velhos, aos sábados, 15h

quinta-feira, 28 de março de 2019

História de uma Mulambo

Por Cândida Camini


Inglaterra, meados do Séc.XVI. 
Seu nome era Annie. Ela era só uma criança, mas desde cedo sua sensibilidade era intensa.
Conseguia perceber a aura das pessoas, mas ela não sabia o que isto significava. Apenas sentia.
E quando isto acontecia, na maioria das vezes era algo ruim, que lhe metia medo e a fazia chorar.
Ao ver alguém envolto em sombras, muitas vezes com olhos a lhe espreitarem através delas, ela cobria os olhos com as mãos, chorava e rezava, rezava e chorava.
Enquanto ela rezava, aquelas nuvens negras iam se desmanchando, escorrendo como lodo em direção à terra.
Vivia com a mãe em uma casa humilde, nos arredores da vila onde moravam.
Sua mãe era rezadeira e bastante procurada pelo povo da região, porque além de ter o dom de curar as pessoas, não cobrava nada por isto. Além das rezas, utilizava-se de vários elementos da natureza para preparar suas poções. E por isto, era chamada por muitos de feiticeira.


Toda vez que alguém vinha pedir auxílio, a mãe de Annnie mandava que fosse brincar no quintal, mas ela ficava espiando pela janela e repetia o ritual de chorar e rezar, rezar e chorar, sempre que alguém chegava envolto naquelas nuvens negras.
Os anos foram passando, Annie era já uma linda moça, inconformada com a vida pobre e humilde e quando completou 18 anos sua mãe decidiu que era o momento de ensinar a ela o seu ofício. A princípio ela não gostou da idéia, mas logo achou que poderia lucrar com isto e realizar o seu sonho, que era sair daquela vila pobre e ganhar o mundo.
Às escondidas de sua mãe, começou a oferecer seus serviços e cobrar por eles. E, diferente dela,  passou a trabalhar para atender todos os pedidos, fossem para o bem, fossem para o mal, desde que pagassem. Claro que a ela juntaram-se seres das sombras, que se alimentavam daquela energia e faziam tudo que ela pedisse.
Ao descobrir o que Annie fazia, sua mãe tentou de todas as formas convencê-la do quanto estava se comprometendo com estes espíritos e que um dia eles iriam cobrar da pior forma possível.
Mas ela só pensava no dinheiro que estava acumulando para poder sair daquele lugar.
Certo dia, foi procurada por um homem muito influente da região e ela, sabendo de suas posses, estabeleceu um valor altíssimo para atender seu pedido. Além de negar-se a pagar, denunciou-as como feiticeiras e, com sua influência, ela e sua mãe foram queimadas na fogueira.
Assim que saiu da carne, seu espírito foi aprisionado e arrastado para as profundezas do Umbral.
Sofreu toda sorte de violência, pois seus credores estavam hávidos por vingança.
Foi escravizada e, como tal, era utilizada da mesma forma que se utilizava deles quando encarnada.
Esgotada em sua energia, quando já não servia mais, foi deixada prá tráz, por sua conta e risco, naquele ambiente fétido e cruel.
Por lá vagou não se sabe por quanto tempo, até que um dia foi resgatada junto com outros espíritos que como ela já não tinham serventia para os seres das sombras.


Cidadela de Exu Caveira
Mas este resgate não a levou para a luz. Quando deu por conta, estava em uma cidadela do astral inferior, sendo cuidada e bem alimentada, não sabia porquê. Quando estavam todos recuperados, aqueles espíritos, juntamente com Annie, foram levados ao responsável por aquele lugar, o qual se apresentou como 'Exu Caveira'.


Ele explicou que são servidores da Luz nas trevas e que trabalhadores são sempre bem vindos, por isso estas expedições como a que resgatou-os. O próximo passo, treiná-los para o trabalho. Aqueles que aceitarem, obviamente. Os demais que sigam seu caminho.
Mesmo sem entender direito, Annie aceitou a proposta e hoje, passado tanto tempo, integra a Falange das Pombas Giras, chamadas de Maria Mulambo*. Seu trabalho? O que sempre fez de melhor quando criança, antes de se deixar levar pela ganância: tirar todo o lixo que o ser humano tem dentro de si. Com Exu Caveira, aprendeu a transmutar este lixo em energias boas, devolvendo a quem merece.
E, hoje, quando o ponto dela toca no Terreiro da Casa Pai Joaquim de Cambinda, ela se apresenta com sua gargalhada e toda a sensualidade que transmite, muitas vezes vestida só com uma flor no cabelo, poque é desta forma que atrai as energias que precisam ser trabalhadas.


 Alupo, Dona Maria Mulambo!

 Alupo, minha Senhora!







* Mulambo: significa farrapo. 
O nome Maria Mulambo é porque quando estão trabalhando nas trevas, entre espíritos degradados, revirando seus lixos, se vestem como mendigas, roupas sujas e esfarrapadas, justamente para passarem despercebidas e fazerem seu trabalho sem serem molestadas.

Ponto de Maria Mulambo









domingo, 24 de março de 2019

Mensagem da Cigana Carmem

por Cândida Camini


Era Gira de Ciganos no Terreiro.
A Cigana Carmem, que trabalha comigo,  participou de um trabalho com uma médium, no final da Gira, onde um portal havia se aberto no chão e todos os sentimentos menos nobres daqueles que ali estavam ou estiveram, eram sugados por ele.
No encerramento, enquanto o Cigano Pablo, Dirigene da Gira naquele dia,  falava com o grupo de médiuns, ela me mostrou no chão, na frente do Congá, um recipiente de cobre, um tacho, ou algo do gênero.
A Gira terminou e eu fiquei pensando o que seria.
Minha intuição me dizia que tinha a ver com aquele trabalho do portal.
Hoje, na hora da descontração da prática de yoga, Carmem me mostrou o significado daquela imagem.
Alguns médiuns que  iam chegando para a Gira, ao pisar o solo sagrado do Terreiro e posicionar-se defronte ao Congá, depositavam ali todos os seus problemas.
No chão, entre o médium e o Congá, a imagem ia alternando-se.  Às vezes uma fogueira ou um tacho de cobre, como Carmem me mostrou; uma chama violeta, um rio, o mar, uma árvore grande, de uma mata fechada. Conforme a Gira do dia, o elemento se apresentava. Em dias de Preto Velho, os médiuns deitavam a cabeça no colo de uma Mãe Preta amorosa, que enxugava suas lágrimas na barra de sua saia rodada.
A mensagem que ficou é a seguinte:

“ Ao entrar no Terreiro para trabalhar, o médium deve depositar no Congá, conforme o elemento da Gira do dia, todos os seus problemas, suas mágoas, tristezas, raivas e inconformações. A partir daí, doar-se integralmente a sua missão, que é praticar a caridade.
Ao final do trabalho, ao dirigir-se novamente ao Congá, lhe será devolvido tudo aquilo que é de sua responsabilidade, para o seu aprendizado. Todo o resto será acolhido e transmutado pela espiritualidade.
Aprenda a identificar a diferença entre um e outro e faça a sua parte.
Seus protetores se encarregarão de orientá-lo e protegê-lo.
Confie, trabalhe, estude e tudo o mais parecerá poeira da estrada, que se dissipa com o vento.”

Cigana Carmem
Optchá!